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Campeãs na aceleração, duas versões do compacto da Volks se enfrentaram para saber qual era o melhor esportivo
Como dois irmãos que resolvem medir forças no quintal da própria casa, Volkswagen Gol GTi e GTS foram à luta para provar qual era o melhor esportivo. Mas o que esperar quando um deles, mais fortão, encara o outro, um pouco mais mirrado? A vitória do primeiro, claro.
Foi o que aconteceu neste duelo dos dois compactos em fevereiro de 1989: uma vantagem prevista do GTi, com seu motor 2.0 a gasolina, que gerava 120 cv de potência – 14 cv a mais que o 1.8 movido a álcool do GTS (apesar de a Volks anunciar 99 cv). Mas o irmão mais fraco saiu feliz da vida com sua atuação.
Eram tempos em que, na verdade, os irmãos estavam se unindo até mesmo geograficamente. Em novembro daquele ano, o Muro de Berlim – que por 38 anos dividiu as Alemanhas Ocidental e Oriental – foi derrubado. Mais que reunificar uma nação, a queda do muro foi um passo decisivo para encerrar a Guerra Fria, que por quatro décadas manteve os países dos blocos capitalista e socialista em permanente clima de tensão.
A reportagem revelou que GTi e GTS haviam melhorado suas marcas em comparação a avaliações anteriores. O GTi manteve os bons resultados na pista, onde havia passado por seu primeiro teste na edição de janeiro.
O GTS também apresentou um desempenho superior. Um exemplo foi a aceleração de 0 a 100 km/h, ao cravar 10,68 segundos, pouquíssima coisa a mais que o GTi, com 10,04 segundos.
Como era de imaginar, o GTi deixou o GTS para trás em todas as provas de desempenho – velocidade máxima, aceleração e retomadas para ultrapassagem -, mas o texto argumentava que era preciso olhar também para o bolso: “Cada fração de segundo a menos tem um custo bem alto se compararmos o valor dos dois carros. É o preço da novidade da injeção eletrônica e do motor 2.0 adaptado para uso esportivo”.
Dono diferenciado
Os donos de GTi não se importavam muito com preço. Afinal, ter essa novidade na garagem era sentir-se diferenciado. Naquele ano, apenas 2.000 unidades foram produzidas, o limite imposto pelo governo para o uso da injeção eletrônica.
Tamanha aura de exclusividade fazia o GTi custar os olhos da cara. Era mais barato somente que as versões top das linhas Opala e Quantum e o Escort XR3 conversível.
O motor 2.0 do GTi tinha alguns caprichos. Ele só aceitava trabalhar com gasolina, uma vez que o sistema de injeção da época era inviável com álcool, devido ao desgaste prematuro. Algo impensável para o nível tecnológico de hoje.
“O motor com injeção exige que os tuchos (que transmitem movimento às válvulas) sejam hidráulicos. Isso evita que, em alta rotação, a vibração das batidas de válvulas seja interpretada pelo conjunto eletrônico como batida de pino, atrasando o ponto da ignição. Com os tuchos hidráulicos, o motor fica mais silencioso, mais do que o GTS, de potência inferior, aumentando a sensação agradável de dirigir o GTi”, explicava o texto, descendo em detalhes técnicos.
Uma das virtudes que mais chamavam atenção no GTi era, de fato, a suavidade do funcionamento do motor. O torque de 18,35 mkgf a 3.200 rpm dava respostas imediatas à mais leve pisada no acelerador. As retomadas de velocidade também eram muito ágeis, garantindo mais a segurança no momento de uma ultrapassagem. Segundo a reportagem, a suavidade acabava impondo um estilo na mesma medida a quem estivesse ao volante.
Era melhor não acelerar de maneira abrupta: “Se o conta-giros passar das 6.100 rpm, a pena será grave: um corte repentino da potência, como se o motor fosse desligado. É preciso passar à marcha seguinte para tudo voltar ao normal”.
E sabe por que isso acontecia? Por causa dos tais tuchos hidráulicos. Acima das 6.100 rpm, eles se descarregariam e ficariam batendo, confundindo o sistema eletrônico. Era preciso tomar muito cuidado para que esse soluço do motor não ocorresse durante uma ultrapassagem, por exemplo.
Potência falsa
Nada que a convivência com o carro não resolvesse. Mas quem não pretendia lidar com essa particularidade do temperamento do GTi tinha como alternativa comprar o GTS. O irmão, embora mais fraco, não refugava diante de altas rotações. Ia até 6.500 rpm sem cortes.
O motor 1.8 a álcool utilizava comando de válvulas especial, vindo do Golf GTi europeu. Além disso, a potência real do GTS era de 106 cv e não os 99 cv anunciados pela Volkswagen. Tratava-se de uma artimanha dos fabricantes para pagar menos alíquota de imposto, que subia para os veículos a partir de 100 cv.
Isso explica o desempenho do GTS, que não passava vergonha frente ao GTi. As diferenças entre eles eram mais visíveis no sistema de freios, agora com boa vantagem do GTi graças aos discos ventilados. “Em todas as velocidades em que foi testado, ele freou em espaços mais curtos que qualquer outro carro nacional”, afirmava o texto.
Como não tinha os discos ventilados, o Gol GTS acabava perdendo eficiência ao ser submetido a constantes repetições de frenagem, por culpa do superaquecimento do sistema. Inadmissível para um esportivo já naqueles dias, quando a maioria dos carros brasileiros era equipada com discos ventilados.
Como os dois Gol usavam combustíveis diferentes, a comparação do consumo considerou o valor do quilômetro rodado. Na cidade, o GTi foi 5,6% mais econômico que o GTS. Isso porque a dosagem exata de combustível no sistema de injeção diminuía o desperdício do anda e para do trânsito urbano. Na estrada, a economia não se repetiu e o GTi gastou 3,9% a mais. Na ponta do lápis, o consumo dos dois foi muito semelhante.
Na parte de dentro, o GTi ganhou um tratamento especial no acabamento. Os bancos não economizavam em luxo e tinham apoio de cabeça vazado. O rádio toca-fitas (lembra dele?) era um dos melhores do mercado: o Rio de Janeiro PLL, da Bosch, que tinha sintonia automática e sistema de procura de estações. Esse equipamento do GTS era o modelo Los Angeles, menos sofisticado.
Painéis iguais
Não deixa de ser curioso falar desse sistema de som quando hoje os carros têm modernas centrais multimídia, que praticamente “conversam” com os motoristas, tamanho o nível de conectividade.
O painel só não era 100% idêntico em ambos porque os mostradores do GTi tinham a cor vermelha, enquanto os do GTS eram um laranja forte que, por sinal, facilitava a leitura. O GTi oferecia vidros e retrovisores elétricos de série – itens opcionais no GTS.
Em comum, eles dividiam a ótima estabilidade e suspensão, que privilegiava a segurança mais do que o conforto. O câmbio trabalhava muito bem, só prejudicado um pouco pela dureza da embreagem, defeito típico nos modelos da Volkswagen da época.
Eram, enfim, os melhores esportivos do mercado nacional, sendo que um deles, o GTi, desfrutava de mais status.
Fonte: Quatro Rodas